Operação policial deixa 8 mortos e não prende alvo na Vila Cruzeiro, no RJ – Mais Brasília
FolhaPress

Operação policial deixa 8 mortos e não prende alvo na Vila Cruzeiro, no RJ

A ação foi realizada pela Polícia Militar e pela PRF

Vila Cruzeiro/Foto: Divulgação/PRF

Oito homens foram mortos pela polícia durante uma operação na Vila Cruzeiro, uma das 13 favelas do Complexo da Penha, na zona norte do Rio de Janeiro, na manhã desta sexta-feira (11). A identidade deles não foi divulgada até a publicação deste texto.

A ação foi realizada pela Polícia Militar e pela PRF (Polícia Rodoviária Federal), que não souberam informar o número de mandados de prisão a serem cumpridos e a classificaram como bem-sucedida, apesar dos óbitos e da fuga do seu principal alvo.

Os agentes tentavam prender Adriano de Souza Freitas, conhecido como Chico Bento e apontado como chefe do tráfico no Jacarezinho. Como a favela foi ocupada pela polícia há três semanas para implantar o Cidade Integrada, programa do governador Cláudio Castro (PL), os criminosos teriam se escondido na Vila Cruzeiro, também dominada pela facção Comando Vermelho.

Segundo as corporações, foram apreendidos sete fuzis, quatro pistolas, 14 granadas, carga e veículos roubados, cocaína e maconha. Uma pessoa que não teve o nome divulgado foi presa, mas não foi Chico Bento.

Os agentes (não foram informados quantos por questões de segurança) ingressaram na comunidade por volta das 4h30 por diversas entradas. Moradores relataram blindados e helicópteros circulando pelas ruas, muitos barulhos de tiros e momentos de medo.

“Estava trabalhando de madrugada em casa quando começaram os fogos, a movimentação e helicóptero. Umas 5h30, começou o tiroteio. Não saí mais”, conta Arthur Lucena, midiativista que criou a página Valores da Penha, que divulga iniciativas positivas dentro da favela.

Ao menos 17 escolas da rede municipal na região, que haviam iniciado as aulas nesta semana, não abriram, deixando 5.740 alunos sem aulas. Três clínicas da família também suspenderam as atividades externas por causa dos confrontos.

As oito mortes ocorreram em apenas um dos locais por onde a polícia entrou, em uma ladeira com casas e comércios. O comandante do Bope (Batalhão de Operações Especiais) da Polícia Militar, tenente-coronel Uirá Ferreira, diz que os óbitos foram em confronto.

Ele afirma que essa equipe, composta de um blindado da PM e de outro da PRF, conseguiu retirar as barricadas colocadas por traficantes, mas foi alvejada mais a frente por homens que estariam fazendo a contenção da casa onde estaria escondido Chico Bento, que conseguiu fugir.

Marcos Aguiar, chefe da comunicação da PRF, diz que esses homens estavam em diferentes posições, alguns deles em seteiras (buracos em muros) e outros em motos. Eles morreram ali e não chegaram a ser socorridos.

A área foi isolada, a Delegacia de Homicídios foi acionada para fazer a perícia e deixou a favela no início da tarde. Quando a reportagem chegou ao local, o último corpo era retirado para ser levado ao IML (Instituto Médico-Legal), onde ocorreria a identificação.

Um dia antes da incursão, nesta quinta (10), um outro homem foi morto durante ação policial no Jacarezinho, o que provocou protestos de moradores, mas o comandante do Bope afirma que a operação não teve relação com o episódio e já estava sendo planejada havia tempos.

A PM afirma que João Carlos Sordeiro Lourenço, 23, conhecido como João do Jaca, reagiu e foi atingido, sendo encaminhado ao Hospital Salgado Filho, onde morreu. A mãe de João, porém, diz que ele estava desarmado na laje de casa no momento da abordagem.

Os porta-vozes da PM e da PRF comemoraram o resultado da operação desta sexta em entrevistas a jornalistas no batalhão da Polícia Militar, no centro do Rio.
“A operação foi bem-sucedida. A gente lamenta a morte de oito pessoas, que poderiam ter sido presas, mas não acataram a ordem da polícia e resistiram à nossa ação. Se eles fossem presos, seria 100% [bem-sucedida], aliás, 99% porque faltou a prisão do Chico Bento”, disse à reportagem o tenente-coronel Ferreira.

“A ação de hoje foi exitosa uma vez que, mesmo o principal alvo não tendo sido localizado, conseguimos recuperar um poderio bélico muito grande, um arsenal que é usado contra a própria população e contra o Estado. Não entramos com o intuito de matar, de ter efeito colateral”, afirmou Marcos Aguiar, da PRF.

Os dois representantes, no entanto, não souberam dizer qual era o número total de mandados de prisão objetivo da operação. Também questionada sobre quantos estavam sendo procurados, a Polícia Civil respondeu apenas que não participou da incursão.

Pela manhã, a PM informou que entrou na comunidade para conter criminosos “que estariam planejando ataques às forças de segurança que ocupam a comunidade [do Jacarezinho]”. Mas, ao ser perguntado, o comandante do Bope demonstrou não conhecer essa ameaça. Disse que a área está muito segura e que, se existe, seria um dado de inteligência.

Segundo o Ministério Público, a justificativa enviada pela PM foi de que, “em resumo, a operação é excepcionalmente necessária para capturar líderes de uma organização criminosa que estão abrigados no Complexo da Penha, comandando de lá diversas práticas criminosas, inclusive em outras comunidades”.

O documento relata ainda “informações de inteligência dando conta de que a organização criminosa dominante na Vila Cruzeiro oferece apoio logístico para criminosos fugidos da polícia”.
A ação desta sexta ocorreu em meio à decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que restringiu as operações policiais para casos excepcionais em comunidades fluminenses enquanto durar a pandemia da Covid-19, na chamada ADPF das Favelas (arguição de descumprimento de preceito fundamental).
No último dia 2, no âmbito dessa ação, a corte formou maioria para determinar que o governo do estado apresente em 90 dias um plano para reduzir a letalidade policial e controlar as violações de direitos humanos por agentes de segurança.

Por Júlia Barbon