Interventor aponta falta de plano operacional pela PM do DF no 8 de janeiro – Mais Brasília
FolhaPress

Interventor aponta falta de plano operacional pela PM do DF no 8 de janeiro

O responsável por fazer o planejamento, o coronel Jorge Eduardo Naime Barreto, ex-chefe do Departamento Operacional da PMDF, estava de férias

Foto: Reprodução/TV Globo

O interventor na segurança pública do Distrito Federal, Ricardo Capelli, afirmou em relatório sobre os atos de 8 de janeiro que a Polícia Militar do DF não elaborou um plano operacional para conter os golpistas que atacaram as sedes dos Três Poderes.

O responsável por fazer o planejamento, o coronel Jorge Eduardo Naime Barreto, ex-chefe do Departamento Operacional da PMDF, estava de férias.
“Não houve a elaboração prévia de Planejamento Operacional nem Ordem de Serviço emitido pelo Departamento Operacional da PMDF em relação aos fatos do dia 08/01/2023”, diz o relatório obtido pela Folha.

Cappelli destaca que havia apenas um Plano de Ações Integradas, elaborado pela Secretaria de Segurança Pública, sem destacar ações para batalhões de choque da polícia, “o que foge ao padrão operacional de manifestações anteriores”.

Sem o planejamento definido, segundo o interventor, não é possível saber qual o efetivo da PMDF estava na Esplanada dos Ministérios no início dos atos.

O documento corrobora a versão apresentada pelo ex-número 2 da Segurança Pública Fernando de Sousa Oliveira, que disse à PF (Polícia Federal) que Anderson Torres deixou o país sem lhe repassar “diretriz” nem o apresentar aos comandantes das forças policiais.

Relatórios internos apontam que haveria um quantidade de 555 policiais militares na área central e na Esplanada dos Ministérios, fato que “parece não estar em sintonia com as imagens captadas pelas câmeras de videomonitoramento da SSPDF”.

“A despeito das informações existentes, o quantitativo de militares dispostos no terreno foi insuficiente para conter o acesso dos manifestantes, principalmente no que tange a linha de revista localizada na via N1 na altura do Buraco do Tatuí, permitindo que manifestantes rompessem o dispositivo e entrassem com materiais proibidos na Esplanada e na linha de contenção na Avenida das Bandeiras, o que resultou na invasão do Congresso Nacional”, completa.

O relatório foi elaborado por Ricardo Cappelli como um de seus últimos trabalhos à frente da segurança pública do DF. O material reconstitui os fatos do dia 6 a 9 de janeiro que, segundo o interventor, teriam colaborado para que os golpistas invadissem e depredassem as sedes dos Três Poderes.

A inteligência da Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal entregou em 6 de janeiro um relatório sobre os riscos da manifestação para o então chefe da pasta, Anderson Torres, como mostrou a Folha.
“Pode-se concluir que não houve falta de informações e alertas sobre os riscos da manifestação”, diz o relatório.

Segundo Cappelli, houve uma série de falhas na preparação da Polícia Militar do DF que facilitaram a invasão dos vândalos. Nos documentos internos, por exemplo, não havia previsão de acionamento de batalhões especializados em conter distúrbios civis, como BOPE, BPCÃES, BAVOP E RPMON.

“Importante destacar a existência de informação de que parcela da tropa alocada para o reforço do efetivo que estava na Esplanada encontrava-se de prontidão em casa.”
O relatório ainda destaca que somente às 15h o efetivo de prontidão do Complexo Administrativo da PMDF, que estava de sobreaviso desde o dia anterior, foi acionado para iniciar a mobilização.

“Houve, portanto, um intervalo de aproximadamente duas horas entre o início da manifestação e a tomada de providências operacionais de reforço para reprimir as ações em andamento”, afirma Cappelli no documento.

As imagens do circuito interno do STF (Supremo Tribunal Federal), divulgadas na quarta-feira (25), ainda demonstraram que a “atitude passiva e ausência de qualquer planejamento pelo DOP –Departamento de Operações da PM– expuseram o STF de maneira inaceitável”.

A Corregedoria da PMDF abriu um inquérito na quinta-feira (26) para investigar a conduta dos policiais militares envolvidos no caso.
Cappelli ainda destacou que, além do coronel Jorge Naime, outros seis comandantes de batalhões e dois chefes de áreas da PMDF estavam de férias no dia do atentado. Todos eram subordinados a Naime.

O ex-comandante da PM Fábio Augusto Vieira, preso por determinação do STF, tem parte da atuação descrita no relatório. Segundo o interventor, Vieira atuou diretamente durante os atos de 8 de janeiro, fazendo ligações e solicitando reforço no policiamento.

“Embora estivesse operando pessoalmente no campo, as evidências indicam que o coronel perdeu a capacidade de liderar seus comandados diretos, uma vez que suas solicitações por reforço não foram consideradas nem atendidas prontamente”, diz o relatório.

Ricardo Cappelli destaca ainda que o acampamento montado por apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) em frente ao QG do Exército, em Brasília, serviu como “apoio logístico e local de concentração” dos manifestantes para as ações de 8 de janeiro.

O texto destaca que duas operações para desmonte do acampamento, em parceira com a Secretaria de Segurança Pública, foram canceladas pelo Exército nos meses de novembro e dezembro, como revelou a Folha. Outra ação foi interrompida durante o desmonte, após hostilidade de bolsonaristas.

O interventor ainda destacou que a ação de desmonte do acampamento e prisão dos golpistas ocorreu na manhã do dia 9 de janeiro após “intervenção do General [Gustavo Henrique] Dutra, comandante militar do Planalto, que ponderou para que a ação acontecesse somente no dia seguinte pela manhã”.

Como a Folha mostrou, a decisão foi tomada após o interventor determinar aos policiais a entrada na área próxima ao quartel-general, cuja jurisdição é do Exército Brasileiro, que posicionou três tanques de guerra para impedir a ação da PMDF.

Após reuniões tensas envolvendo o interventor, ministros do governo Lula (PT) e generais, o consenso foi para que a operação de desmonte ocorresse de forma planejada no dia seguinte, pela manhã.

Por Camila Mattoso e Cézar Feitosa