Veja as mudanças que são vistas como bombas para o governo e esperança para aposentados

Riscos fiscais traçados pelo Orçamento de 2022 incluem ações e temas que são vistos como esperança de ganho para aposentados

Os riscos fiscais traçados pelo Orçamento de 2022 incluem ações e temas que são vistos como esperança de ganho para aposentados. São os casos da revisão da vida toda, julgada pelo STF (Supremo Tribunal Federal) no começo de dezembro, e da aposentadoria especial pelo “pico de ruído”.

A maior parte desses julgamentos não tem um impacto financeiro definido. Os que têm chegam a R$ 480 bilhões –caso da revisão da vida toda. Além disso, cálculos apresentados pelo governo em documentos como os riscos fiscais da LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) e em ações no Supremo são questionados por institutos e especialistas.

Em março, pouco depois de a revisão da vida toda passar pelo plenário virtual, o INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) divulgou que um julgamento do tema favorável aos aposentados implicaria aos cofres públicos um gasto extra de R$ 360 bilhões em 15 anos –valor ainda maior que o calculado em 2021, de R$ 46 bilhões em dez anos.

A União, de acordo com a Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2023, estima que a aprovação do entendimento poderia impactar as contas públicas em R$ 480 bilhões.

No cálculo do Ieprev (Instituto de Estudos Previdenciários), o ganho nas aposentadorias com a revisão é de 3,1%, valor 25% menor que o estimado pelo INSS.

“É difícil entender por que há tantas discrepâncias assim, principalmente se elas foram calculadas por órgãos do governo”, afirma Luis Eduardo Afonso, professor da USP e especialista em Previdência Social.

“Todo cálculo previdenciário pode apresentar diferenças, porque a gente está falando de valores distribuídos em períodos muito grandes de tempo”, afirma Afonso. “São valores muito elevados e, neste momento que o país vive, fundamentais para entender o impacto dessa medida.”

Segundo a AGU (Advocacia-Geral da União), o cálculo de impacto de ações fiscais é calculado pela entidade que conduz a política pública afetada.

“A metodologia de cálculo não é disponibilizada por potencial comprometimento de estratégia processual”, afirma a instituição.

Veja, abaixo, alguns desses temas. Foram consultados os advogados Rômulo Saraiva, Fernando Goncalves Dias, João Badari, Gustavo Bertolini, André Bittencourt e Adriane Bramante.

Os valores apresentados pelo governo nos riscos fiscais da LDO podem considerar o impacto ao longo de mais de um ano, mas esse prazo não foi detalhado no documento.

Revisão da vida toda

– Custo fiscal estimado pelo governo: R$ 480 bilhões (o INSS já estimou ao STF gasto extra de R$ 360 bilhões em 15 anos, mas também já apresentou estimativa de R$ 46 bilhões em dez anos)
– O que é? A revisão, julgada pelo STF em 1º de dezembro, corrigiu o que o tribunal entendeu como uma distorção da lei da Previdência de 1999. Na época, a reforma criou duas fórmulas de cálculo para a aposentadoria -a de transição e a definitiva. Os que usaram a primeira tiveram apenas as contribuições posteriores ao Plano Real, de julho de 1994, consideradas. Tal cálculo pode ser desfavorável para parte dos aposentados, especialmente aqueles que tinham uma renda maior antes de 1994.
– Quem tem direito? Tem direito quem: 1) começou a receber o benefício há menos de dez anos; 2) adquiriu o direito de se aposentar antes da reforma da Previdência, em novembro de 2019; e 3) recebeu ou recebe qualquer benefício que tenha sido calculado com base na lei 9.876/99, como pensões e auxílios. Por enquanto, a revisão não é automática. Para que isso aconteça, será necessária uma ação civil pública para forçar o INSS a pagar a revisão automaticamente -até mesmo para os aposentados que não fizerem o pedido judicial.

APOSENTADORIA ESPECIAL DO VIGILANTE

– Custo fiscal estimado pelo governo: R$ 151 bilhões (ao STF o INSS já informou que a concessão custaria R$ 154 bilhões diluídos ao longo de 35 anos)
– O que é? O STF precisa decidir se vigilantes e outras atividades perigosas, em que se comprove risco à integridade física, podem continuar com o direito à aposentadoria especial mesmo após a reforma da Previdência, que começou a valer em novembro de 2019. Em dezembro de 2020, o STJ já decidiu que, independentemente do porte de arma, a atividade do vigilante deve ser considerada especial. Tal categoria permite ao trabalhador aposentar-se quando completar 25 anos de profissão. Além de completar o período de trabalho, o cidadão que começou a contribuir após a reforma precisa ter, no mínimo, 60 anos. Para quem já estava no mercado, há regra de transição.
– Quem tem direito? Quem trabalhou como vigilante e conquistou o direito à aposentadoria após novembro de 2019, quando entrou em vigor a reforma da Previdência.

CÁLCULO DO SALÁRIO DE CONTRIBUIÇÃO EM ATIVIDADES CONCOMITANTES

– Custo fiscal: não disponível
– O que é? A revisão impacta aqueles que trabalharam em mais de um lugar durante um mesmo período. Os pedidos de revisão acontecem porque o INSS fazia o cálculo com a atividade considerada primária -aquela em que o aposentado ficou por mais tempo-, enquanto a outra entrava na conta proporcionalmente. Agora, somam-se as contribuições, respeitando o teto previdenciário. O STJ (Superior Tribunal de Justiça) decidiu dessa forma em maio de 2019, e ainda não se sabe se o INSS vai recorrer -o que faria a ação ir para o STF.
– Quem tem direito? Quem trabalhou em duas ou mais empresas ou atuou como autônomo e trabalhou em uma empresa ao mesmo tempo, por exemplo. O segurado precisa ter começado a receber a aposentadoria há no máximo dez anos e ter contribuído ao INSS nas atividades a serem consideradas na revisão. A aposentadoria do segurado só é revista se ele entrar na Justiça. Os que se aposentaram após a decisão de maio de 2019 já têm as contribuições somadas.

RECEBIMENTO DE PARCELAS DE APOSENTADORIA CONCEDIDA JUDICIALMENTE

– Custo fiscal: não disponível
– O que é? O tema decidiu qual benefício prevalece quando o requerente ganha dois pedidos de aposentadoria: na Justiça e administrativamente. Há casos em que o cidadão solicita a aposentadoria, o benefício é negado e ele, então, entra na Justiça para que o pedido seja revisto. A demora do processo, porém, pode levar o requerente a fazer uma nova solicitação administrativa. Se, ao fim, ambos os processos são aceitos, há um impasse: o segurado tem direito aos atrasados do primeiro pedido, caso decida pelo segundo, mais vantajoso? Em junho deste ano, o STJ decidiu que sim. O aposentado tem direito aos atrasados do processo que foi judicializado, ao mesmo tempo em que escolhe receber o benefício pelo segundo pedido administrativo. A ação já transitou em julgado, ou seja, foi encerrada e não cabem mais recursos.
– Quem tem direito? Têm direito aqueles que: 1) judicializaram um pedido de aposentadoria negado; 2) fizeram novo pedido administrativo em decorrência da demora do processo na Justiça; 3) ganharam a ação e também conseguiram o pedido administrativo; e 4) optaram pelo segundo pedido administrativo, mas têm direito a atrasados do primeiro.

APOSENTADORIA ESPECIAL PARA ‘PICO DE RUÍDO’

– Custo fiscal: não disponível
– O que é? A discussão desse tema refere-se ao critério utilizado para definir as condições de ruído às quais o trabalhador se expôs em sua vida laboral. O STJ reconheceu que deve-se utilizar o Nível de Exposição Normalizado (NEM), quando for possível e, quando não for, deve-se considerar o pico de ruído, ou seja, o de maior ruído aferido. As medições são feitas por meio de uma perícia técnica judicial, que deverá medir a persistência do ruído. Tais condições podem levar o trabalhador a ter direito à aposentadoria especial.
– Quem tem direito? Tem potencial de conseguir a aposentadoria os trabalhadores que tiverem em seu PPP (Perfil Profissiográfico Previdenciário, um documento com o histórico laboral do trabalhador) algum laudo que apresente ruído. Os casos de revisão são possíveis para aqueles que tenham começado a receber a aposentadoria há menos de dez anos.

Por Daniela Arcanjo 

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