Queda de traficante na Colômbia é maior golpe a crime organizado desde Escobar, diz Duque

Otoniel foi capturado durante a operação Osiris, em Necoclí, perto da fronteira com o Panamá

O governo da Colômbia anunciou neste sábado (23) a captura do narcotraficante mais procurado do país, Dairo Antonio Úsuga, conhecido como Otoniel, líder da maior quadrilha do país, o Clã do Golfo.

“Este foi o maior golpe contra o tráfico de drogas neste século no nosso país”, comemorou o presidente Iván Duque, em pronunciamento à nação. “Ele só é comparável à queda de Pablo Escobar [em 1993, quando foi morto].”

Otoniel, 50, foi capturado durante a operação Osiris, em Necoclí, perto da fronteira com o Panamá e um dos principais redutos do Clã do Golfo. Imagens divulgadas pelo governo mostram o traficante com as mãos algemadas e cercado por militares. De acordo com o comandante das Forças Armadas, general Fernando Navarro, ele era buscado havia sete anos. Um agente morreu na ação, segundo Duque.

Para apanhá-lo, a polícia colombiana antecipou “um trabalho por satélite contra ele com agências dos Estados Unidos e do Reino Unido”, explicou o general Jorge Vargas. Cerca de 500 militares, apoiados por 22 helicópteros, participaram da operação.

O traficante usava táticas de guerrilha para burlar a força pública. Viajava sozinho, a pé ou de mula, e nunca dormia duas noites seguidas no mesmo lugar, relataram as autoridades colombianas. Nos últimos dias da perseguição, adentrou na mata virgem da região de Urabá, onde fica Necoclí, e se desfez de seus telefones, substituindo-os por correios humanos.

Antes de sua captura, a organização foi dizimada em uma série de investidas das autoridades contra o círculo próximo do líder do narcotráfico, segundo o governo colombiano. Uma delas é a Operação Agamemnon, lançada em 2016, que matou e captrou dezenas de seus aliados, de acordo com a polícia.

O líder do Clã do Golfo é acusado de enviar dezenas de lotes de cocaína aos EUA, além do assassinato de policiais, recrutamento de menores e abuso sexual de crianças, entre outros crimes, afirmou o presidente colombiano.

A Colômbia chegou a oferecer uma recompensa de US$ 800 mil, e os EUA, US$ 5 milhões para quem fornecesse informações que ajudassem a encontrar o narcotraficante. A Justiça americana o acusa de liderar uma organização “fortemente armada, extremamente violenta”, que “usa a violência e a intimidação” para controlar as rotas do tráfico de drogas e laboratórios de processamento de cocaína. Ele enfrenta um processo de extradição para se apresentar à corte do Distrito Sul de Nova York.

Otoniel comanda um grupo de paramilitares que se autodenomina Autodefesas Gaitanistas da Colômbia (AGC), também conhecidas como Clã do Golfo, presente em quase 300 cidades do país, segundo o centro de estudos independente Indepaz.

Financiado principalmente pelo narcotráfico, o garimpo ilegal e a extorsão, o grupo é apontado pelo governo como um dos responsáveis pela onda de violência no país, a pior desde a assinatura do acordo de paz com as Farc, em 2016.

Em 2017, Otoniel tinha anunciado a intenção de chegar a um acordo para se apresentar à Justiça, mas o governo respondeu com uma perseguição da qual participaram ao menos mil militares.

A queda do líder da maior quadrilha de traficantes da Colômbia é o principal êxito do governo do presidente conservador no combate ao crime organizado no país que mais exporta cocaína no mundo.

Após quatro décadas de luta contra o narcotráfico, a Colômbia se mantém como o principal produtor mundial de cocaína e os Estados Unidos, como o maior consumidor da droga.

Mas ainda que a captura de Otoniel represente o fim do Clã do Golfo, o diretor da consultoria Colombia Risk Analysis, Sergio Guzman, afirmou à agência de notícias Reuters que um novo líder deve assumir a organização.

“É algo grande porque ele é o maior chefe do tráfico na Colômbia”, disse Guzman, acrescentando, no entanto, que a captura não irá mudar as bases do tráfico de drogas. “Otoniel está fadado a ser substituído.”

DE CAMPONÊS A CRIMINOSO MAIS PROCURADO

Dairo Antonio Úsuga nasceu em 15 de setembro de 1971 no município de Necoclí, em uma estratégica região do noroeste da Colômbia, muito próxima da fronteira com o Panamá, mas também do Pacífico e do Caribe.

Ele era o sétimo de nove filhos de Ana Celsa David e Juan de Dios Úsuga, um casal que diz ganhar a vida com a venda de porcos, galinhas e gado.

Aos 18 anos, Otoniel uniu-se ao Exército de Libertação Nacional (ELN), uma guerrilha marxista desmobilizada em 1991. “Não era revolucionário, era o que tinha e foi embora com eles”, contou sua mãe em uma entrevista ao jornal colombiano El Tiempo em 2015. Ele não fez parte do processo de paz que pôs fim a 26 anos de luta armada deste grupo rebelde.

Entre 1993 e 1994 uniu-se às Autodefesas Camponesas de Córdoba e Urabá (ACCU), uma organização paramilitar de extrema direita, criada para combater as guerrilhas e com ligações com o narcotráfico. “Era um camponês não muito ideologizado”, explicou o especialista em segurança Ariel Ávila à agência de notícias AFP.

A ACCU fez parte das Autodefesas Unidas da Colômbia, que se desmobilizaram em 2006 por iniciativa do governo de Álvaro Uribe (2002-2010). Mas, segundo o analista, Otoniel se sentiu desapontado com o processo de submissão à Justiça e decidiu se manter na ilegalidade.

Otoniel passou a liderar o Clã do Golfo após a morte do seu irmão, Juan de Dios, conhecido como Giovanni, em um confronto com a polícia em 2012. Montou um aparato criminoso com presença em quase 300 dos 1.102 municípios do país, principalmente no Pacífico, um local estratégico para o envio de cargas de drogas, segundo o centro de estudos independente Indepaz.

“Tem um portfólio amplo de atividades criminosas, que incluem garimpo ilegal e a passagem de imigrantes para o Panamá”, detalhou Ávila. Segundo o centro de investigação do crime organizado InSight Crime, o Clã do Golfo também atua na contratação de gangues de rua locais para realizar em seu nome atividades de microtráfico, extorsão e pistolagem.

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