Em 6 pontos, veja relevações sobre Bolsonaro a partir do celular de Mauro Cid – Mais Brasília
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Em 6 pontos, veja relevações sobre Bolsonaro a partir do celular de Mauro Cid

A partir de acesso às conversas de Mauro Cid, a PF teve ao menos outras cinco autorizações de Moraes para quebra de sigilos bancário, telemático e fiscal de pelo menos 13 pessoas e de uma empresa

Foto: Alan Santos/Presidência/Flickr

Documentos da investigação que mira Jair Bolsonaro (PL), familiares e seus ex-assessores mostram que uma série de quebras de sigilo determinadas por Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), expôs a rotina e detalhes do gabinete presidencial.

Uma quebra ordenada ainda em 2021 permitiu à Polícia Federal acessar a nuvem em que eram armazenadas todas as conversas do tenente-coronel Mauro Cid, ajudante de ordens do ex-presidente.

As mensagens, às quais a Folha de S.Paulo teve acesso em parte, mostram detalhes da rotina da Presidência e diálogos entre assessores abordando desde assuntos corriqueiros, como escalas de horário de servidores e desavenças entre colegas de trabalho.

A partir de acesso às conversas de Mauro Cid, a PF teve ao menos outras cinco autorizações de Moraes para quebra de sigilos bancário, telemático e fiscal de pelo menos 13 pessoas e de uma empresa -incluindo três assessores de Bolsonaro e duas assessoras da ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro.

Veja 5 dessas revelações a partir das mensagens:
1) FRITURA DE PAULO GUEDES
Em 16 de outubro de 2021, Mauro Cid informou ao chefe de gabinete de Bolsonaro, Célio Faria, sobre um novo aumento no preço do diesel e comentou em seguida: “PG não dura muito”, em alusão ao então ministro Paulo Guedes.

A mensagem foi enviada por volta das 13h. No final da tarde, às 16h17, Cid voltou a falar com Célio para avisá-lo sobre a ida do então presidente à Granja do Torto, residência oficial de Guedes durante parte do governo.

Cerca de duas horas depois, Cid mandou nova mensagem e disse ao chefe de gabinete: “Não cai”. Célio Faria respondeu que já imaginava essa decisão: “Ele vai abrir as pernas”.
Cinco dias após o encontro com Guedes, Bolsonaro anunciou que o governo criaria um auxílio para caminhoneiros em razão da alta do diesel. Ele disse que a medida beneficiaria cerca de 750 mil trabalhadores no setor.

2) DECBOCHE NO PLANALTO
As quebras de sigilo telemático -Mauro Cid foi alvo de ao menos três em cerca de dois anos- também mostram a equipe do gabinete presidencial em conversas cotidianas, na organização da agenda do presidente, discutindo entre si por erros de comunicação e, também, ironizando integrantes do governo.

Em 24 de julho de 2021, Célio Faria reclama de problemas na agenda de Bolsonaro devido a pedidos que chegavam diretamente ao chefe do Executivo. Após ressaltar sua função na organização da agenda, Célio se queixa a Cid devido à aceitação de pedidos pelo então presidente.

Cid, então, responde em tom de deboche: “Hahahahahahaha Não tem jeito…Pelo menos Gilson e Seif sumiram essa semana”. Jorge Seif era o secretário de Pesca à época. Gilson Machado, o chefe da Embratur. Os dois participavam de vários compromissos com Bolsonaro.

3) BOLSONARO E MINISTRO DO TSE
A quebra de sigilo de assessores mostra uma troca de mensagens em que é citado um encontro sigiloso no Palácio da Alvorada entre o então mandatário e o ministro do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) Carlos Horbach.

De acordo com o diálogo, esse encontro teria ocorrido na manhã do dia 16 de outubro de 2021, um sábado. Não há registro dessa reunião na agenda oficial de Bolsonaro.

“Precisamos operacionalizar buscar o ministro do TSE onde ele estiver e trazer sem aparecer”, escreve, na véspera do encontro, Célio Faria, então chefe do gabinete pessoal de Bolsonaro e que se tornaria ministro da Secretaria de Governo em 2022. A mensagem é enviada para Mauro Cid.

Um dos julgamentos em que o ministro se posicionou a favor do ex-presidente ocorreu em 28 de outubro de 2021, 12 dias após o suposto encontro no Alvorada.
Naquele dia o TSE decidiu rejeitar a cassação de Bolsonaro e do vice, Hamilton Mourão, por participação em esquema de disparo em massa de fake news nas eleições de 2018.

A maioria da corte eleitoral concluiu que foi comprovada a existência de um esquema ilícito de propagação de notícias falsas via WhatsApp em 2018 para beneficiar Bolsonaro, mas avaliou que não se demonstrou gravidade suficiente para cassar a chapa vencedora.

Diferentemente da maioria, Horbach e Sérgio Banhos entenderam que não foram apresentados elementos que permitiam chegar à conclusão de que houve algum tipo de disseminação de fake news em benefício do ex-presidente.

4) EXAME ESCONDIDO DE COVID
Uma troca de mensagens entre dois assessores do gabinete de Jair Bolsonaro (PL) mostra que o então presidente fez um exame de Covid em 2021 após participar de uma manifestação com apoiadores em Brasília e teria determinado sigilo sobre o caso.

Na mesma época, ele atacava autoridades e pessoas que defendiam e praticavam o distanciamento social.
De acordo com essas conversas, o presidente manifestou sintomas de Covid na noite de 15 de maio de 2021, um sábado, dia em que participou sem máscara de aglomeração durante o ato na capital federal.

“No exame comparativo, ele está com o pulmão com 10% comprometido. Mas está bem…. dormiu a noite toda, das 21h às 5h30. Oxigenação 97! Zeitoune acha que é COVID… Pr não quer fazer exame”, escreveu na manhã do dia seguinte (16 de maio) Mauro Cid, ajudante de ordens de Bolsonaro.
O assessor se referia a Marcelo Zeitoune, um dos médicos da Presidência. “Pr” é a sigla para “presidente da República”.

A mensagem foi enviada a Célio Faria, então chefe do gabinete pessoal da Presidência e que em 2022 viraria ministro da Secretaria de Governo.

Após a primeira informação, Cid mandou a Célio outra mensagem, cerca de 20 minutos depois, afirmando que Bolsonaro havia decidido fazer o exame, mas que queria “reserva absoluta”.

Às 14h32 do mesmo dia, Cid informou Célio que o exame de Bolsonaro havia dado negativo para a Covid.
No dia seguinte, na manhã de segunda-feira, 17 de maio, o então presidente da República parou no cercadinho do Palácio da Alvorada, onde apoiadores faziam vigília diária, e voltou a atacar as medidas recomendadas pelos órgãos sanitários internacionais e brasileiros.

Bolsonaro elogiou o agronegócio, que havia organizado o ato em sua homenagem dois dias antes, e chamou de idiotas os que respeitavam o isolamento social.

5) MAIS ENCONTROS SECRETOS
A quebra dos sigilos telemáticos de assessores do ex-presidente reforça os indicativos de que vários encontros e compromissos oficiais do governo anterior ficaram de fora dos registros formais.

Ministros do próprio governo, integrantes do Judiciário, políticos e empresários, entre outros, aparecem nesses diálogos como tendo se reunido com o então presidente da República apesar de nada disso constar na agenda pública.

Um desses encontros ocorreu em 13 de outubro de 2021 na casa do ministro Dias Toffoli, do STF.
Em mensagem enviada a Célio às 22h18 desse dia, Mauro Cid informou que Bolsonaro estava na casa de Toffoli e citou ainda outros nomes, como o procurador-geral da República, Augusto Aras, e André Esteves, presidente do conselho de administração e sócio sênior do BTG Pactual.

6) AÉCIO E ARAS FORA DA AGENDA
Outros encontros que não constam da agenda de Bolsonaro ocorreram com o deputado federal e ex-presidenciável Aécio Neves (PSDB-MG), em 27 de março e em 19 de outubro de 2021, indicam as mensagens dos assessores de gabinete de Bolsonaro.

Aécio afirmou, por meio de sua assessoria, que esteve com o ex-presidente “para buscar apoio do governo para o projeto de quebra de patentes de vacinas do qual foi relator e defendeu como presidente da Comissão de Relações Exteriores da Câmara, e, depois, para discutir a posição do governo em relação aos vetos”.

Outro encontro foi com Aras, no Palácio do Planalto, fora da agenda de ambos, em 30 de abril de 2021.
A CPI da Covid estava à época em sua fase inicial e, na semana seguinte, começaria a etapa de tomada de depoimentos, com as falas dos ex-ministros da Saúde de Bolsonaro Luiz Henrique Mandetta, Nelson Teich e Eduardo Pazuello, além do então titular da pasta, Marcelo Queiroga.