Futuro ministro da Previdência fala em mudanças na reforma e critica idade mínima para mulheres – Mais Brasília
FolhaPress

Futuro ministro da Previdência fala em mudanças na reforma e critica idade mínima para mulheres

Carlos Lupi afirma que redução da fila do INSS é prioridade para Lula

Foto: Reprodução

O futuro ministro da Previdência, Carlos Lupi (PDT), criticou pontos da reforma da Previdência formulada pelo governo Jair Bolsonaro (PL) e aprovada pelo Congresso em 2019. Ele afirma que quer discutir o tema com o governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Lupi, que é presidente do PDT, pondera não ter estudado o tema com profundidade, mas avalia haver “absurdos” na reforma aprovada, sobretudo no que diz respeito à idade mínima para mulheres se aposentarem. Ele defende uma flexibilização conforme a região do país.

“Tem que ter 60 anos de idade [para se aposentar], por que 60 anos de idade? Eu acho que tem que pensar em regionalizar. A realidade do Nordeste é uma, a realidade do Sudeste é outra”, afirmou à Folha.

O futuro chefe da Previdência ainda afirma que foi encarregado de acabar com a fila do INSS.

O sr. foi anunciado a poucos dias da posse. Já tem uma lista de prioridades? A Previdência está sucateada. Esses últimos quatro anos para o trabalhador foram só perdas de direitos. A reforma criou uma série de obstáculos, inclusive invertendo um processo constitucional que diz que o ônus da prova cabe a quem acusa. Então, o trabalhador é que tem que provar que contribuiu com a Previdência, não o empregador.

Isso é algo que pode ser revisto? Na primeira etapa, estamos começando o levantamento, e a primeira missão que o Lula me deu é acabar com a fila da Previdência. Tenho algumas ideias. E aí, vocês têm que colocar a devida precaução de eu não ter ainda conhecimento —eu não fui ainda nem no ministério, aliás, não tem ainda onde ir porque o ministério foi juntado, dividido.

Tem um projeto de terceirização do atendimento nas agências. Isso poderia ser um caminho? Pode ser. E vou fortalecer. O que a gente puder fazer para melhorar o atendimento é bom. Minha impressão inicial, sem examinar, [é que] um grande pacto federativo resolve isso rapidamente, 80% dos casos. Por que não se pode ter convênios com os estados e municípios para a cessão de espaços físicos para fazer agências, de pessoal burocrático, para ajudar na efetivação de aposentadorias?

O sr. falou de uma coisa que poderia ser revista na reforma da Previdência. Tem mais pontos? Não estudei com profundidade ainda esse tema. Vejo alguns absurdos. Continuo achando, por exemplo, um absurdo a questão das mulheres. O trabalho da mulher é dupla jornada, e a Previdência não considera. Só vale o que ela contribui. Se ela tem dupla jornada, ela não pode ter uma tabela de data limitada como tem hoje. Tem que ter 60 anos de idade [para se aposentar], por que 60 anos de idade? Tem que pensar em regionalizar. A realidade do Nordeste é uma, a realidade do Sudeste é outra.

Não seria extinguir a idade mínima, mas flexibilizar conforme a região? Conforme a região. Mas isso é uma coisa que eu ainda não tenho profundidade, tenho que estudar. Acho que hoje as mulheres são sobrecarregadas nesses pontos da Previdência e você tem muita dificuldade de comprovar.

O sr. ainda vai analisar, depois vai bater o martelo com quem? Tem que falar com a Fazenda, com o Planejamento, ver o dinheiro que tem. Isso é governo, não é só o ministro da Previdência. Com o Congresso também. Algumas coisas precisam ed um novo projeto. Mas vou te dizer, já fui deputado. A maior dificuldade que eu vi na minha vida até hoje é deputado votar contra benefício.

Voltando para o tamanho da fila. No período recente, a de requerimento inicial até deu uma caída. Era de 1,6 milhão e passou para 1,3 milhão.

Em outubro parece que baixou de 1 milhão. Não, ela nunca baixou de 1 milhão. Isso é fato, não é fake. Está 1,3 milhão. Tem que somar. Uma coisa é a aposentadoria, [outra é] a pensão, e o BPC [Benefício de Prestação Continuada] é a maior parte porque exige uma série de aferimentos. Sou beneficiário da Previdência, tenho que ter um Cadastro Único? Para quê? Para eu ter direito a desconto na passagem de ônibus, gratuidade na passagem de metrô. Por que eu não crio uma carteira? Vou criar uma carteira nacional dos aposentados.

Seria uma integração do Cadastro Nacional de Informações Sociais com o CadÚnico? Também pode. São 35 milhões de brasileiros que têm algum benefício da Previdência Social. Por que isso não fica com um número só?

No governo Temer, o sr. gravou um vídeo em que prometia desmentir a “falácia” do déficit da Previdência. Mesmo com a reforma, os dados ainda apontam um resultado negativo. Qual sua percepção hoje? Não é hoje, é sempre, tem que ter coerência. Primeiro tem que se colocar na arrecadação da Previdência tudo aquilo que por lei é destinado a ser da Previdência. Por que não se coloca na arrecadação da Previdência a parcela dela no PIS, no Cofins?

Mas isso é seguridade social, não? É, mas é da Previdência. Previdência e seguridade social, não só a Previdência. Então, temos que colocar na arrecadação da Previdência tudo que a lei diz que é da Previdência, porque só se coloca hoje a arrecadação do INSS. Está errado. Eu não tenho os números hoje. Mas todos os números que eu tinha anteriormente são de que ela era autossuficiente, desde que os recursos destinados constitucionalmente para ela fossem considerados.

O sr. já tem um nome para a presidência do INSS? Ainda não. Única coisa que tenho na cabeça é que tem que ter um prestígio forte aos quadros de carreira, do INSS e da Dataprev.

Governos anteriores fizeram vários pentes-finos. Essa política vai continuar? Primeiro, tem que dar transparência aos dados da Previdência. Quem tem medo de dar transparência é quem está escondendo alguma coisa errada. O Estado não pode ver o aposentado e pensionista como um peso.

Como foi a conversa com o presidente Lula? Quando sondaram o sr. para a Previdência? Já tem algum tempo. Eu guardei [a informação] porque sentia muita reação contrária do mundo político, do PDT. ‘Eu quero ter ação de ponta, o que isso vai resolver no meu município?’. E a Previdência não tem uma ação finalística efetiva. Como vocês acham que não pode alterar alguma coisa se você mexe com a vida de 35 milhões de pessoas? Partido trabalhista que defende o trabalhador não vai defender o pós-trabalhador, que é aposentadoria? Isso é uma marca. Isso começou a convencê-los.

Benefício para o aposentado e pensionista é recurso público que vai circular, alimenta a economia. Pensar que isso é despesa é ignorância. Estou muito confiante porque, primeiro, ele [Fernando Haddad, futuro ministro da Fazenda] sabe que isso é prioridade. Segundo, tudo o que você fizer para melhorar vai aparecer.

O sr. falou com o Ciro Gomes? Falei ontem [quarta-feira, 28]. Já tinha falado dessa sondagem anteriormente. E falei hoje. Ele falou: ‘Lupi, o que você for eu topo, agora é servir ao Brasil. Essa é uma área que só um louco como você é capaz de enfrentar’. Não sei se é pejorativo ou elogiado. Acho que elogiado, porque eu sou meio louco disso mesmo. ‘Vai fundo, estou contigo.’

Ele acha que o PDT tinha que ter espaço no ministério? Ele acha que, se convidasse, a gente não podia negar.

O PDT vai ser base do governo? Vai ser base.

O sr. acha que ele deu ministérios demais para partidos como PSD, MDB e União Brasil? Ele [Lula] precisa ter maioria, precisa ter governabilidade. Se isso viabilizar 100 a 120 votos, mais o que ele já tem…

RAIO-X

Carlos Lupi, 65

Nascido em Campinas (SP), Lupi ajudou o ex-governador do Rio de Janeiro Leonel Brizola a fundar o PDT em 1980. Assumiu a presidência do partido pela primeira vez em 2004. Em 2007, foi convidado por Lula para assumir o Ministério do Trabalho e Emprego. Ele se manteve no cargo até dezembro de 2011, na gestão de Dilma Rousseff. Em 2012, voltou à presidência nacional do PDT.